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Friday 6 May 2011

McQueen and his birds

Minha enorme vontade de visitar a exposição do Alexander McQueen em NY foi frustrada. Tive que me contentar com o fraquinho “Genius of a Generation” enquanto meu “Savage Beauty” não chega. Mas as parcas páginas da obra de Kristin Knox me chamaram a atenção para uma das marcas registradas de McQueen: os pássaros. Presentes em estampas (inclusive na capa do referido livro), texturas (uso de penas com exuberância em roupas e acessórios, e até mesmo de pássaros empalhados, como na sua extraordinária coleção SS 2001) e formas (mulheres-pássaros?).

AW 2009, estampa com centenas de pássaros. Com o movimento do vestido, parecem quase tirar a modelo do chão.


SS 2001, águias prontas para resgatar um mulher quase pássaro também?

AW 2009. Quase um cisne, protegido em sua plumagem.

McQueen teve um difícil background: cresceu em um a moradia pública em uma das então decadentes regiões de Londres, foi rejeitado pelo pai quando ainda novo, e era maltratado na escola. Dono de uma forte personalidade e de um talento para poucos, foi determinado ao seguir sua carreira (e com enorme sucesso). Mas imagino que todos os conflitos de sua infância e juventude estivessem constantemente presentes no decorrer de sua vida. Creio que os mundos fantásticos e sinistros criados por ele fossem uma forma de libertação de seus próprios fantasmas (de uma forma extremamente criativa e bela). 

Em sua amizade com Isabella Blow, ele encontrou não apenas uma importante e influente conselheira que lhe abriu várias portas no mundo da moda, como também um bálsamo para suas angústias. Segundo o documentário “McQueen and I”, eles eram “dois forasteiros atraídos pela exuberância e espírito rebelde um do outro”.

Blow e McQueen, em Hilles.
Isabella era casada com Detmar Blow, herdeiro do homônimo arquiteto de Arts & Crafts, que projetou uma casa para seu próprio uso em 1913. A casa, chamada Hilles, em Gloucestershire, também era refúgio constante de McQueen. Lá ele podia ser ele mesmo. Podia ser, sem receio, mais um inglês apaixonado pelo campo. 

Hilles, em Gloucestershire.
Lembrei-me de sua entrada final no desfile de alta costura para o AW 1997-98, criado para a Givenchy. Aparentemente tímido, caminha segurando um falcão. E no referido documentário, para mim, uma das cenas mais marcantes foi ver esse mesmo McQueen claramente feliz e descontraído, brincando com um falcão no jardim de Hilles.

Passarela de alta costura da maison Givenchy, 1997.

Em um país onde cada metro quadrado (ou cada jarda quadrada!) é valorizado por ter um território tão restrito, somos privilegiados por termos os “public rights of way”, caminhos em meio a propriedades rurais em que o público tem o direito juridicamente protegido para passar e repassar. Sobretudo agora, na primavera, em todos os cantos temos a chance de observar os animais daqui: já vi coelhos, raposas, faisões e veados correndo (sim, os faisões estavam mesmo no chão, correndo assustados) nos campos e bosques.

Acho a relação do inglês com o campo algo extraordinário. Adoramos uma cachoeira ou uma praia, mas não temos a mesma relação com a natureza. Talvez porque durante metade do ano eles tenham um clima tão ruim (frio e escuro), esse contato funcione como um subterfúgio. Além disso, pensamos em nossa natureza como um recurso inesgotável a ser explorado. O inglês, altamente urbanizado, tende a pensar no campo como um bem precioso, a ser protegido contra o desenvolvimento.

Volto, agora, aos pássaros de McQueen. Vejo em suas criações um desejo de fazer sua mulher erguer vôo, alçada por centenas deles, ou emprestando a elas suas asas/penas, aconchegando-as, acariciando-as. Um reflexo talvez da liberdade que sentia ao se divertir com seu falcão, da paz proporcionada pela absoluta tranqüilidade do campo? Não sei, provavelmente não terei essa resposta. Mas acredito firmemente que grande parte da beleza de suas coleções venham não apenas de seu profundo senso estético, como também desses momentos de mágica harmonia.

 

Vídeo da abertura de seu desfile SS 2008, dedicado a Isabella Blow. Asas a sua musa.





Os céus do campo para Isabella Blow. SS 2008.



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